ARTIGO - Sinodalidade como profecia social
- pascom9
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Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal
No dia 7 de junho de 2025, na Véspera da Solenidade de Pentecostes, a Arquidiocese de Natal abre oficialmente seu Primeiro Sínodo Arquidiocesano. Com o tema “Igreja de Natal, que dizes de ti mesma?” e o lema evangélico “E vós, quem dizeis que eu sou?” (Mt 16,15), este Sínodo nasce como expressão de uma Igreja sinodal, que busca caminhar junto com seu povo, escutando-o, discernindo à luz do Espírito Santo e testemunhando Nosso Senhor Jesus Cristo. Esse estilo sinodal, quando vivido com humildade e coerência, torna-se também uma verdadeira profecia social, uma voz lúcida e transformadora diante dos desafios do nosso tempo.
O Documento Final da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (2024) reconhece essa dimensão profética da sinodalidade ao afirmar que ela pode fazer da Igreja “uma voz profética no mundo de hoje” (n. 47). Essa afirmação não se limita ao âmbito interno da Igreja, mas também aponta para uma forma concreta de presença e intervenção no mundo, especialmente nos âmbitos social, político e econômico. A sinodalidade, compreendida como escuta mútua, corresponsabilidade e discernimento comunitário, oferece uma alternativa viável e humanizadora em um tempo marcado pela fragmentação, pela polarização e pela exclusão.
Numa “época marcada pelo aumento das desigualdades, pela crescente desilusão com os modelos tradicionais de governança, pelo desencanto com o funcionamento da democracia, pelas crescentes tendências autocráticas e ditatoriais, pelo domínio do modelo de mercado sem levar em conta a vulnerabilidade das pessoas e da criação, e pela tentação de resolver conflitos por meio da força em vez do diálogo” (Doc. Final do Sínodo, n. 47), a prática sinodal emerge como sinal de esperança.
Ela testemunha que é possível construir comunidades e sociedades mais participativas, onde cada pessoa é reconhecida em sua dignidade e chamada a contribuir com sua voz. Como sinal visível disso, o Sínodo Arquidiocesano de Natal se propõe não apenas a escutar os fiéis engajados, mas também os que estão distantes, os que sofrem, os jovens, as mulheres, os pobres, os povos tradicionais, os diversos setores da sociedade, os movimentos sociais e aqueles que se encontram nas periferias — geográficas e existenciais.
O Sínodo pretende ser um sinal humilde de uma Igreja que aprende ouvindo. Trata-se de uma atitude profética em um mundo acostumado a hierarquias rígidas e discursos autorreferenciais. A sinodalidade ensina que a autoridade se exerce pela escuta, pelo discernimento e pelo serviço. Isso não significa fragilidade institucional, mas maturidade eclesial. É nesse sentido que a sinodalidade constitui uma profecia social, porque denuncia as formas autoritárias, centralizadoras e excludentes de exercer o poder e anuncia uma nova lógica, fundada na reciprocidade, no diálogo e na comunhão.
O estilo sinodal é também um testemunho concreto diante da crise de representatividade que afeta instituições civis e democráticas. Em um tempo em que muitos se sentem invisíveis ou descartados, a Igreja sinodal, ao incluir todos no processo de discernimento, revela uma cultura de inclusão, participação e escuta que pode inspirar práticas sociais e políticas mais humanas e justas. Quando a Igreja se dispõe a escutar não apenas os formadores de opinião e os setores influentes da sociedade, mas também os pobres, os pequenos e os silenciados, ela cumpre sua missão de ser sinal do Reino de Deus, onde os últimos são os primeiros.
Além disso, a conversão sinodal das relações promove uma cultura de cuidado e corresponsabilidade. Num mundo ferido pelo individualismo e pelo descarte, ela valoriza os vínculos, reconhece a interdependência e fomenta a solidariedade. Isso, por si só, constitui um ato profético, sobretudo quando se volta às vítimas da violência, da miséria, do racismo e das injustiças estruturais.
Por fim, o Sínodo de Natal quer ser expressão dessa profecia social, não como quem possui respostas prontas, mas como quem se dispõe a aprender com o povo e com a história. Ao perguntar “Igreja de Natal, que dizes de ti mesma?”, a Arquidiocese se coloca diante de um espelho, reconhecendo que sua voz só terá autoridade se for expressão do Evangelho vivido no concreto da vida. E ao dirigir-se também à sociedade com a pergunta “E vós, quem dizeis que eu sou?”, ela manifesta o desejo de ser presença significativa no mundo, para servir e ser fermento do Reino de Deus.
A sinodalidade, portanto, não é apenas um modelo interno de organização eclesial. Ela é uma proposta de vida, um estilo que pode fecundar também a cultura, a política, a economia. Vivida com humildade, ela faz da Igreja uma verdadeira profecia social: sinal do Reino de Deus que já está entre nós, mas que ainda esperamos com esperança viva na Parusia.