Por Pe. Matias Soares Pároco da Paróquia de Santo Afonso Maria de Ligório - Conjunto Mirassol - Natal
A formação permanente é uma das grandes preocupações da Igreja para vida do povo de Deus. Todos os documentos pós-conciliares falam sobre a importância desta prioridade, não só para uma parte dos membros eclesiais, mas para todos os fiéis batizados. A formação continuada é o meio pelo qual a Igreja potencializa suas lideranças, tornando-as sempre mais capacitadas para o amadurecimento espiritual, intelectual e o diálogo com a cultura. Esse caminho é imprescindível no desenvolvimento integral das pessoas e, por conseguinte, para o exercício qualificado da missão da Igreja na sociedade e no mundo. Essa preocupação com o aprimoramento dos seus componentes é um fator de fundamental relevância para o bem comum e o eficiente empenho dos sujeitos envolvidos, tanto na ação evangelizadora, como na promoção da dignidade humana.
Na América Latina, a V Conferência de Aparecida apresentou todo um percurso pedagógico a ser implementado para que a formação cristã e eclesial, para os discípulos missionários de Jesus Cristo, fosse assumida por todas as estruturas eclesiais (cf. DAp, Cap. VI: O caminho de formação dos Discípulos Missionários). A dimensão existencial e mistagógica é o paradigma espiritual e humanístico do processo de formação. A educação para a Igreja tem em vista o “humanismo integral e solidário”. Neste, a formação racional é considerada com a abertura ao transcendente. Por isso, o Papa Francisco lança a proposta de um Pacto Educativo Global “para reavivar o compromisso em prol e com as novas gerações, renovando a paixão por uma educação mais aberta e inclusiva, capaz de escuta paciente, diálogo construtivo e mútua compreensão, convidando todos a ‘unir esforços numa ampla aliança educativa para formar pessoas maduras, capazes de superar fragmentações e contrastes; reconstruindo o tecido das relações em ordem a uma humanidade mais fraterna’” (cf. Papa Francisco: “ENCONTRO RELIGIÕES E EDUCAÇÃO: PACTO EDUCATIVO GLOBAL”).
Uma ideia precisa e bem determinada é a seguinte: na atualidade, é extremamente importante que formemos uma ‘mentalidade sobre a necessidade da formação permanente’, a partir destes pressupostos que têm levado o Papa Francisco a nos situar sobre a emergência de assumirmos essa preocupação com o nosso autocuidado e a atenção ao que é importante, não só para quem está fora, mas também na própria Igreja. Essa mentalidade pode ser fomentada e fortalecida ao serem ordenadas e construídas estruturas que favoreçam essa realização que, nos nossos dias, passa a ser cada vez desafiador. Pois, o que se nos impõe é uma cultura do provisório, determinada por muitas informações e pouca sabedoria, muita técnica e pouca sensibilidade à complexidade da realidade. Sintomático é o fato que essa construção do conhecimento no contemporâneo já esteja sendo direcionada para uma ‘inteligência artificial’. A intensiva valorização e aprimoramento do que ‘a inteligência distanciada do humano’, com a elevação do artificial e a superação até mesmo das subjetividades, tendo em vista uma outra etapa da história do conhecimento, com suas futuras formas de ser pensada a educação e a formação, cada vez mais está ganhando espaço e possibilidades novas.
A nova Ratio Fundamentalis – Razão Fundamental – para a formação presbiteral prioriza esta urgência. Não se trata de supervalorizar um aspecto da formação. Todas devem estar integradas e valorizadas: a espiritual, humana, intelectual e pastoral. Mesmo assumindo as proposições já postas no Concílio II e aprofundadas por João Paulo II – Pastores dabo Vobis – O magistério do Papa Francisco trouxe elementos novos, que são bem colocados na proposta, principalmente no concerne a ‘capacidade de discernimento’ - à qual caberia uma reflexão à parte – que os presbíteros no contemporâneo são chamados a aprofundar. A formação permanente deve envolver a nossa existência. É um caminho imprescindível na opção vocacional que fazemos a cada instante das nossas vidas. Num recente discurso a representantes que estavam reunidos para um congresso sobre a formação permanente dos presbíteros, o mesmo enfatizou que “Na perspectiva do serviço, a formação não é uma operação extrínseca, a transmissão de um ensinamento, mas torna-se a arte de colocar o outro no centro, fazendo sobressair a sua beleza, o bem que traz consigo, evidenciando os seus dons e também as suas sombras, as suas feridas e os seus desejos. Deste modo formar sacerdotes significa servi-los, servir a sua vida, encorajá-los no seu percurso, ajudá-los no discernimento, acompanhá-los nas dificuldades e apoiá-los nos desafios pastorais” (cf. Vat. News, 08/02/24). Com essa ponderação o Papa coloca o significado e a importância da formação permanente, com sua finalidade antropológica, integral e a serviço da dignidade de todos os seres humanos.
Aprimoremos e levemos muito a sério o que isso significa, para cada cristão e, muito especialmente, para todos nós ministros ordenados. A formação permanente como oxigênio do espírito, da inteligência e da condição humana na sua totalidade, considerando todas as dimensões que contêm e são contidas pelo humano para que possamos caminhar rumo a um mundo melhor, pode ser um sonho assumido por todos os que anseiam pela integração pessoal e favorecimento da amizade social. Temos que pensar o sentido da formação e o primado da educação, não só como direito, mas acima de tudo como ‘paixão’. É uma escolha. Tem que ser um amor ao saber. É uma opção fundamental e pessoal. A formação permanente nos fornece liberdade. Quem forma proporciona liberdade e ganha liberdade. Na experiência cristã, quem reza e estuda, se eleva a Deus e se volta para amar os semelhantes. Nos nossos dias, também está sendo chamada em causa a preocupação com o cuidado com a nossa ‘Casa Comum’. A preservação e a capacidade de viver em harmonia com a criação. Com desenvolvimento sustentável. A formação permanente é uma das preocupações que temos a fomentar em nossas comunidades eclesiais. Mas, como Igreja, seguindo o que o Papa Francisco no Pacto Educativo, temos que promovê-la e leva-la a termo também na sociedade. Somos chamados a buscar parcerias para firmar pactos educativos – nacional, estadual, municipal – em todas as realidades do nosso imenso Brasil. A Igreja, que é Mãe e Mestra, pode articular iniciativas internas, através das suas próprias instituições educativas, como também, a partir do seu princípio de ética social - a subsidiariedade - e buscar parcerias para que a educação e a formação permanente sejam bens ofertados a todos os sujeitos eclesiais e sociais. Assim o seja!