Dom Jaime Vieira Rocha Arcebispo de Natal
Prezados leitores/as!
Nas últimas semanas, dois acontecimentos se destacaram no cenário eclesial. Um, na realidade internacional, com as celebrações do 10º aniversário de morte do Cardeal italiano, Carlo Maria Martini (2012-2022), outro, no cenário nacional, com a aprovação da CNBB de transformar o estudo sobre a “animação bíblica da pastoral”, em documento. Os dois acontecimentos estão em relação com a Palavra de Deus: o Cardeal Carlo Maria Martini foi o grande biblista, de renome e de muita colaboração no campo da exegese cientifica. Jesuíta, professor de Crítica Textual, eleito Arcebispo de Milão, em 1979, por São João Paulo II, autor de vários livros sobre a Palavra de Deus e de espiritualidade, foi um dos grandes animadores da renovação da vida pastoral no cenário, não só italiano mas também internacionalmente. Sua dedicação aos estudos da Bíblia levou-o a realizar, na grande cidade italiana, os encontros de Lectio divina ou leitura orante da Palavra, aos quais acorriam grandes multidões, especialmente os jovens daquela metrópole. Esta é uma peça-chave na ação pastoral: à luz da Palavra evangelizar as pessoas. Por isso, a CNBB transformou os estudos sobre a animação bíblica em documento. O texto, apresentado na Assembleia Geral de 2021, inspirado pela Exortação Apostólica Pós-sinodal de Bento XVI Verbum Domini, ao ser aprovado como documento da CNBB, tem o escopo de fazer com que todos os fiéis e ministros ordenados sejam animados a reconhecer que é da natureza da própria Igreja deixar-se animar pela Palavra em todos os seus projetos evangelizadores.
Neste mês de setembro, a Igreja nos chama a renovar a nossa atenção acerca da Palavra de Deus, procurando ser não meros ouvintes, mas praticantes da Palavra (cf. Tg 1,22). Ser praticantes da Palavra significa deixarmo-nos fecundar por ela, assim como Maria, exemplo perfeito de escuta da Palavra e de reciprocidade entre Palavra e fé. Eis o que o mês da Bíblia nos propõe: deixar que a Palavra nos envolva, plasme cada instante de nossa vida, viver em plena sintonia com a Palavra divina (cf. Exortação apostólica Verbum Domini, 27). Para nós que assumimos o caminho de conversão pastoral o exemplo da Mãe da Palavra encarnada é de suma importância: “a nossa ação apostólica e pastoral não poderá jamais ser eficaz, se não aprendermos de Maria a deixar-nos plasmar pela ação de Deus em nós” (Verbum Domini, 27). Quando isso acontece em nós, então se realiza o que Santo Ambrósio (bispo e doutor da Igreja, nascido em 340 e morto em 397, foi bispo de Milão, na Itália) ensinava sobre o fato de que cada cristão que crê, em certo sentido, concebe e gera em si mesmo o Verbo de Deus: se há uma só Mãe de Cristo segundo a carne, segundo a fé, porém, Cristo é fruto de todos (Verbum Domini, 29).
Eis o que a Palavra realiza em nós, quando assumimos a sua centralidade na vida e na pastoral de nossas comunidades: a Palavra anima, isto é, dá a alma à nossa comunidade, é a substância da nossa missão. E isso, mais enfatizado ainda porque a Palavra é, sobretudo Jesus, o Verbo encarnado, a Palavra criadora do Pai, que veio habitar entre nós e em nós (cf. Jo 1,14). A Palavra sustenta a casa, a comunidade, a Igreja.
Convido a todos, não somente neste mês, mas em toda ação pastoral a que nunca se esqueçam da animação bíblica da vida e da pastoral. É preciso que a Palavra esteja no coração de cada católico, não somente nas mãos. Nenhuma doutrina da Igreja é ensinada sem ter a base da Palavra. Toda doutrina é inspirada na Palavra de Deus e é ensinada para que seja sustentada a fé dos cristãos e para que vivam mais e mais na relação de amizade com Deus e no compromisso de caridade para com os irmãos e irmãs.