ARTIGO - Raízes, identidade e esperança
- pascom9
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Ir. Vilma Lúcia de Oliveira, FDC;
Historiadora, Professora, Coordenadora Geral do Arquivo Metropolitano da Arquidiocese de Natal, Membro da Comissão de Cultura e Educação da Arquidiocese de Natal, Coordenadora da Subcomissão de Bens Culturais da Igreja
Os bens culturais são mais do que pedras antigas, pinturas raras ou livros guardados em estantes. Eles são raízes que nos sustentam, identidade que nos define e esperança que nos projeta para o futuro. Cada obra, cada tradição, cada canto popular carrega em si a memória de um povo, o sopro de sua alma.
O termo “Bens Culturais” nasceu em meio às dores da guerra. Quando o mundo se via em ruínas, percebeu-se que não bastava proteger corpos e territórios: era preciso salvar também aquilo que dá sentido à existência — a arte, a fé, a história, os tesouros invisíveis que moldam a vida coletiva.
Na segunda metade do século XIX, Bruxelas e Haia foram palco de encontros que plantaram as primeiras sementes dessa consciência. Ainda não se falava oficialmente em “Bem Cultural”, mas já se reconhecia que objetos e lugares que guardam memória mereciam proteção especial. Era o início de um pacto silencioso entre nações: preservar o que nos lembra quem somos.
Com o avanço das guerras, os acordos foram muitas vezes ignorados. Mas em 1954, em Haia, a voz da humanidade se ergueu novamente: tudo que testemunha a cultura, a arte, a religiosidade e a história de um povo deve ser protegido. Ali se consolidou a ideia de que ferir um bem cultural é ferir a própria dignidade humana.
A definição se ampliou: obras arquitetônicas, pinturas, livros, músicas, objetos religiosos, cidades históricas, sítios arqueológicos e até manifestações folclóricas passaram a ser reconhecidos como bens culturais. Eles não são apenas coisas: são símbolos vivos da identidade de um povo. Preservá-los é preservar a memória coletiva, é guardar o fio que nos conecta ao passado e nos conduz ao futuro.
Em 1970, a UNESCO reforçou esse compromisso. O foco era combater o tráfico ilegal de obras, os saques e a destruição de patrimônios. A noção de Bem Cultural se expandiu, incluindo novas categorias e defendendo a repatriação de bens levados de seus países de origem. Era um chamado à justiça e ao respeito entre nações.
No Brasil, a Constituição de 1988 trouxe um olhar ainda mais abrangente. Reconheceu que os bens culturais não pertencem apenas a museus ou arquivos, mas estão presentes em todas as áreas do conhecimento. São multidimensionais: vivem na arquitetura, na música, na literatura, nas festas populares, nas tradições religiosas, nos saberes transmitidos de geração em geração. Preservá-los é preservar a alma da nação. Hoje, falar de bens culturais é falar de raízes, identidade e esperança.
Raízes que nos sustentam e nos lembram de onde viemos. Identidade que nos dá forma e nos distingue no mundo. Esperança que nos projeta para o amanhã, porque sem memória não há futuro. Proteger os bens culturais é proteger a vida em sua dimensão mais profunda. É cuidar daquilo que nos une, que nos transcende, que nos faz humanos. É reconhecer que cada pedra, cada canto, cada gesto tradicional é parte de um grande mosaico que chamamos humanidade.
Assim, quando preservamos nossos bens culturais, não estamos apenas guardando objetos. Estamos guardando histórias, sentimentos, sonhos. Estamos guardando a chama que ilumina o caminho das gerações. Estamos, enfim, cuidando das nossas raízes, da nossa identidade e da nossa esperança.





