Diác. Paulo Felizola
Paróquia de Nossa Senhora do Ó – Nísia Floresta
Os profetas do mercado financeiro, diante do crescimento do PIB brasileiro, têm alardeado a necessidade de o Banco Central elevar a SELIC (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia)[i], até que em março de 2025, esta, possa chegar a 12,25%. A princípio, tal procedimento teria a finalidade de conter a elevação dos preços, nos limites da meta inflacionária[ii], diante da perspectiva de aumento dos gastos públicos, do aperto no mercado de trabalho, provocado pela redução do desemprego, do avanço no crescimento do PIB e pelos danos à produção de alimentos provocados pela seca e as consequentes queimadas.
Ouvindo tais recomendações o COPOM (Comitê de Política Monetária)[iii], em sua última reunião realizada entre os dias 17 e 18 do corrente mês de setembro, decidiu elevar a SELIC em 0,25 pontos percentuais, fixando-a em 10,75% ao ano, sinalizando um viés de alta, conforme sugerido pelos profetas[iv].
Muito se tem falado a respeito dos impactos de uma taxa de juros elevada no cotidiano da sociedade brasileira, porque impede que a economia cresça em um ritmo mais elevado, uma vez que a elevação da taxa básica, também, induz as outras taxas de juros ao aumento, restringindo, principalmente, o consumo das famílias, o investimento das empresas e a capacidade dos investimentos públicos, por potencializar a dívida pública. Dessa forma, juros altos significa um forte obstáculo ao crescimento da demanda agregada, que já se encontra bastante reprimida. Portanto, elevar a taxa de juros só funciona como contenção de um processo inflacionário se a alta generalizada dos preços na economia for determinada por um excesso de demanda, o que não é o caso da economia brasileira no momento, que já está convivendo com taxas de 40% para o consumidor e de 20% para a indústria.
Por outro lado, o fantasma do desabastecimento que ocorreria por conta da estiagem e dos incêndios, está afastado pois, como já é sabido, a safra agrícola já está colhida, logo não deve haver pressão sobre os preços dos alimentos decorrente de uma redução na oferta desses produtos.
Na verdade, o grande monstro vislumbrado pelos profetas do mercado divinizado é o crescimento da economia, apesar de ser este o objetivo central da política econômica. A estratégia de elevação da taxa básica de juros tem, assim, sem a presença de uma pressão de demanda, o objetivo de reduzir as atividades comerciais e industriais, transferindo o dinheiro das famílias e do setor produtivo para os bancos, através do spread bancário[v], e transferir recursos públicos para o capital financeiro, através do aumento do custo da dívida pública[vi], graças aumento da SELIC. A estratégia é, portanto, de um lado, elevar o endividamento das famílias, do setor produtor e do setor público e, por outro lado, engordar a burra dos financistas.
Para além de uma questão econômica, a financeirização da vida, com suas estratégias perversas, como a de usar o aumento da taxa SELIC, é, também, uma questão moral, na medida em que compromete a dignidade da vida humana e promove a morte, principalmente dos mais indefesos, pois leva ao desemprego e à redução da renda.
Nos parece, assim, que os financistas e todo o sistema financeiro são os atuais pais da morte, do que trata o profeta Jeremias (Jr 5,20-31). São os injustos, os ateus práticos, os idólatras do dinheiro que formam o grupo que enriquece com o roubo, com a distorção do direito e com a opressão aos empobrecidos.
Levar o ser humano às dificuldades de sobrevivência é afrontar o quinto mandamento pois, assim, nos ensina o Catecismo da Igreja Católica quando diz que:
“A lei moral proíbe expor alguém a um risco mortal sem razão grave, bem como recusar ajuda a uma pessoa em perigo.
A aceitação pela sociedade humana de condições de miséria que levem à própria morte sem se esforçar para remedir a situação constitui uma injustiça escandalosa e uma falta grave. Todo aquele que nos seus negócios se der a prática usurária e mercantis que provoquem a fome e a morte de seus irmãos de humanidade comete indiretamente um homicídio, que lhe é imputável”. (CIC n. 2269)
[i] A Selic é a taxa de juros média praticada nas operações compromissadas com títulos públicos federais com prazo de um dia útil.
[ii] O Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que a meta para a inflação, a partir de janeiro de 2025, é 3,00%, mesmo valor vigente para 2024 e que havia sido anteriormente definido para 2025 e 2026. O intervalo de tolerância estabelecido também permaneceu o mesmo: mais ou menos 1,50 ponto percentual em relação à meta, isto é, de 1,50% a 4,50%.
[iii] O Comitê de Política Monetária (COPOM) é um órgão do Banco Central do Brasil, que tem a finalidades de estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa básica de juros básica.
[iv] Banco Central do Brasil. Ata da 265ª reunião do COPOM
[v] Spread bancário é simplesmente a diferença entre os juros que o banco cobra ao emprestar e a taxa que ele mesmo paga ao captar dinheiro, O valor do spread varia de acordo com cada operação, dependendo dos riscos envolvidos e, normalmente, é mais alto para pessoas físicas do que para as empresas.
[vi] A dívida pública é o dinheiro que o governo toma emprestado para cobrir o déficit fiscal. Ou seja, quando a arrecadação é menor do que as despesas, a administração contrai dívida para conseguir honrar seus compromissos. Essa dívida gera um custo cujo montante depende da taxa básica de juros, a SELIC. No ano de 2023 esse custo representou cerca de 43,23% de todo o orçamento executado. Portanto, quanto mais alta a SELIC, maior o custo da dívida pública, maior o ganho dos financistas, conforme podemos verificar no gráfico abaixo elaborado pela Auditoria Cidadã da Dívida e disponível, na data de 24/09/2024, em www.extraclasse.org.br/opiniao/2024/01/o-grafico-elaborado-pela-auditoria-cidada-da-divida-esta-correto/
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