Por Pe. Paulo Henrique da Silva
Diretor de estudos do Seminário de São Pedro
“Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que eram sujeitos à Lei, e todos recebermos a dignidade de filhos” (Gl 4,4-5). Assim, o apóstolo Paulo apresenta o mistério da Encarnação. Nós celebramos este mistério no tempo do Natal, que acontece da noite do dia 24 de dezembro até a festa do Batismo do Senhor. Nós celebramos porque no mistério da Encarnação do Filho de Deus, “nova luz da sua glória brilhou para nós” (MISSAL ROMANO. Prefácio do Natal do Senhor, I). É um mistério: “reconhecendo a Jesus como Deus visível a nossos olhos, aprendemos a amar nele a divindade que não vemos” (idem). No Natal a Igreja é iluminada pelo dom por excelência de Deus que é o seu Filho. De fato, “Deus amou tanto o mundo que deu o seu Filho” (Jo 3,16). Nós celebramos o que recebemos. É importante ver esta ligação da fé celebrada com a fé acreditada.
Seguindo o testemunho de São Paulo, podemos dizer: antes de transmitir o que recebemos (cf. 1Cor 11,23; 15,3), nós celebramos. E isso acontece porque não transmitimos alguma coisa, algum conhecimento abstrato, mas transmitimos ALGUÉM, que é manifestação de Deus. “Ele, no mistério do Natal que celebramos, invisível em sua divindade, tornou-se visível em nossa carne” (Prefácio do Natal do Senhor, II)
A Igreja é convocada a viver dessa luz, que vinda ao mundo a todos ilumina (Jo 1,9). É a luz de Cristo, luz do mundo. Pois ele, “gerado antes dos tempos, isto é, vivendo desde toda a eternidade no seio do Pai (cf. Jo 1,1; Hb 1,3-4), entrou na história da humanidade para erguer o mundo decaído. Restaurando a integridade do universo, introduziu no Reino dos Céus o homem redimido” (Idem). Eis o centro da liturgia da Igreja, que é a liturgia do mundo, envolvido pela luz de Cristo. Uma liturgia que celebra a inclusão de todos os homens e todas as mulheres no ato supremo de amor de Deus: Ele nos deu o seu Filho. A Igreja nasce deste maravilhoso intercâmbio como diziam os Padres da Igreja, deste admirável comércio: “no momento em que vosso Filho assume nossa fraqueza, a natureza humana recebe uma incomparável dignidade, ao tornar-se ele um de nós, nós nos tornamos eternos” (Prefácio do Natal do Senhor, III). Eis aqui a nova criação. Eis aqui o motivo pelo qual o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó, o Deus de nossos pais, criou o homem e a mulher: para fazê-los participantes de sua vida divina. Somos envolvidos pela sua vida divina e assim, assumidos na nossa condição de criatura, elevada à dignidade de filhos e filhas. Celebrar o Natal significa: “Deus veio a nós, de tal maneira que pode habitar no mundo e em nós com seu esplendor terrível e glorioso. Com o nascimento do Menino nada mais é igual. Desde o coração mesmo da realidade, que é o Verbo feito carne, tudo tende, com a inexorabilidade do amor, para Deus, sem que o mundo tenha que ver-se reduzido a cinzas por seu fogo abrasador e o de sua santidade e justiça” (Karl Rahner).
Para sermos introduzidos na vida filial de Jesus Cristo, eis porque viemos ao mundo. E isto é manifestado a todas as nações na Festa da Epifania: Cristo, Filho eterno, nascido no tempo para “iluminar todos os povos no caminho da salvação” (Prefácio da Epifania do Senhor). Este caminho de salvação é o ato pelo qual o Pai, manifestando Cristo em nossa carne mortal, nos recria na luz eterna de sua divindade. Dessa luz a Igreja recebe graças sobre graças, e é chamada a proclamar que Jesus é o Filho amado do Pai, que “veio habitar entre os seres humanos” (Prefácio do Batismo do Senhor) e é também o portador do Espírito, no qual “foi ungido com o óleo da alegria e enviado para evangelizar” (idem).