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A Gestão e a Sinodalidade


Pe. Matias Soares

Mestre em Teologia Moral (Gregoriana)

Pós-graduado em Teologia Pastoral (PUC-Minas)

Membro da SBTM (Sociedade Brasileira de Teologia Moral)

Pároco de Santo Afonso M. de Ligório/Natal-RN



A gestão é ação que exige participação. Quando há reta intenção e maturidade humana na condução de processos organizativos de uma instituição, há deveras a preocupação de envolver os que fazem parte da mesma, para que também estes possam ser agentes do processo de qualificação e sistematização da administração. Quando nos colocamos a serviço e assumimos responsabilidades de gerenciamento, ainda mais nos tempos hipermodernos, com toda a força das mídias sociais, devemos ter clareza que ninguém pode mais centralizar as ações da gestão em torno de si e de pessoas que são subservientes a uma estrutura viciada e de controle centralizado. O poder no contemporâneo é microfísico.


A Igreja está voltada a pensar o seu modus operandi, tendo em vista o dinamismo da sinodalidade. A ideia é que exista uma maior participação de todo o povo de Deus nos mecanismos e organizações administrativas das comunidades eclesiais. Mesmo tendo os pressupostos teológicos, a partir da própria comunhão trinitária, passando pela sacramentalidade da Igreja, sintetizada na santíssima eucaristia e, historicamente, confirmada pela sucessão apostólica, a sinodalidade é um estilo que toda a Igreja é chamada a assumir e testemunhar, neste terceiro milênio (cf. Papa Francisco). O que compete a todos precisa ser assumido por todos. A Igreja, como comunidade de fé, esperança e amor, outrossim, deve ver a ‘boa e virtuosa administração’ como uma forma de evangelizar, dando testemunho de honestidade, dinamismo, empreendedorismo e justa aplicação dos recursos e bens que pertencem ao povo de Deus.


A participação, a comunhão e a missão são princípios que traduzem o significado da sinodalidade também na gestão dos bens eclesiásticos. Nem os Bispos deveriam gerenciá-los, pensando o seu próprio benefício e bem estar, sem a anuência das comunidades que compõem uma Igreja Particular, que é a Diocese. Do mesmo modo, os demais ministros ordenados, que têm o direito de ter o necessário para viver dignamente, mas sem escandalizar, nem burlar o bom senso, principalmente quando o seu estilo de vida fere a realidade pobre das comunidades, nem negar o respeito às pessoas. Os bens eclesiais também não podem ser usados para que os ministros ordenados enriqueçam, nem beneficiem os seus agregados biológicos e afetivos, fazendo o mesmo que muitas pessoas públicas e políticas fazem nas prefeituras e entidades estatais. A justiça para ser autêntico testemunho, tem que começar de casa. A questão que deve ser posta é o como estar sendo gerenciada a nossa casa comum, que, neste caso, é a Igreja.


O apoio e as necessárias doações solicitadas ao povo de Deus são justos e fonte de fortalecimento da missão da Igreja; mas a responsabilidade de administrá-los, tendo em vista o bem comum, é imprescindível. Uma gestão na qual não é valorizada a transparência gera muitas desconfianças e descréditos. Assim como os problemas de ordem sexual, o descaso e a abertura à verdade na gestão eclesial também são imorais. Nela, não poder haver só a aparência de que se administra bem, mas é necessário que esse ‘serviço’ seja feito de modo qualificado. Nas comunidades cristãs há sempre a presença de fiéis leigos, que ficam felizes em poder colaborar com o bem de todos. É recomendável, em casos específicos, que a justa remuneração seja feita aqueles que vivem exclusivamente para o exercício deste mister. O apostolado dos fiéis leigos deve ser respeitado e reconhecido de modo relacional e cooperativo também neste aspecto da vida da Igreja.


Às Igrejas Particulares e demais realidades vinculadas a elas é preceituado que devem existir os Conselhos pastorais e administrativos (cf. CDC, Cân. 492). Esses colegiados têm que existir nas paróquias, com tipificações apropriadas para cada um, que são organismos de controle e assessoramento dos que assumem a missão de reger os bens da Igreja, desde o Sumo Pontífice até os que estão nas instituições menores. Os procedimentos próprios da composição da sinodalidade são salutares e via eclesial urgentíssima na nova configuração da missão da Igreja nos tempos de hoje, que contemplam também o jeito de gerir e administrar com eficiência e eficácia os bens pertencentes aos fiéis batizados que constituem a sua realidade.


A construção dos Diretórios Administrativos, deste modo, deve passar pelo crivo e a escuta destes conselhos. Se a proposta é sinodal, é exigida a escuta de todos. Os fiéis leigos, que compõem os conselhos paroquiais, em assembleia, podem ser convocados para o amadurecimento e monitoramento das proposições do planejamento de gerenciamento dos bens patrimoniais e econômicos. Os princípios que são exigidos para a administração pública dos entes federativos, no Art 37 da Constituição Federal, do mesmo modo, por analogia, podem ser aplicados à gestão eclesiástica, a saber: - a legalidade; - impessoalidade; - moralidade; - publicidade e eficiência. Declinemos sobre o significado de cada um destes. Dentre tantas iniciativas a serem empregadas, uma possível para os nossos dias seria um “Portal da Transparência” com todas as entradas e saídas do que é doado pelas comunidades ao justo e ordenado funcionamento das estruturas que estão a serviço da evangelização.


Enfim, cabe declarar que o Papa Francisco tem cobrado transparência das ações da Igreja. Temos que estar atentos para que a questão não seja posta só quando pensamos nos casos de pedofilia e abuso de menores. Não! A gestão dos bens eclesiásticos também exige honestidade e justa aplicação dos fundamentos evangélicos e canônicos. As estruturas que estão constituídas em “algumas” Arqui (Dioceses) são erigidas já com o propósito de não funcionarem. São colocadas à frente delas, muitas vezes, “algumas” pessoas incapacitadas, tanto tecnicamente, como moralmente, para que as mesmas não façam funcionar o que deveria existir para fazer acontecer o bem comum. Deste modo, tornam-se instituições de faz de conta, que existem para salvaguardar as estruturas viciadas e corrompidas. Quando isso acontece, todo o corpo padece e o descrédito vai corroendo as instâncias eclesiásticas. A sensação que se tem é que vivemos numa “bolha”, sem atenção ao estado de crise que vive a instituição neste momento. Cada vez mais, se faz urgente que o futuro da Igreja seja assumido massivamente pelos fiéis leigos em toda as estruturas, que exigem a gestão de bens e serviços, tendo em vista a coletividade. A sinodalidade eclesiástica pode ser um caminho restaurador neste sentido. Vale a aplicação. Assim o seja!

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