Pe. Paulo Henrique da Silva
Professor de Teologia
Estamos vivendo, na Igreja, o Tempo Pascal. Da Vigília Pascal, celebrada no último dia 30 de março, até a Solenidade de Pentecostes, a Igreja vive cinquenta dias de festa, de júbilo, de cantos de exultação, aleluia, celebrando a Páscoa, a Ressurreição de Jesus Cristo. É o tempo mais importante do Ano Litúrgico, para o qual tendem todos os outros tempos, todas as festas e solenidades. Cristo ressuscitou! Essa é a grande proclamação, o grande anúncio, de onde partem todas doutrinas, todo ensinamento sobre a fé da Igreja. De fato, com a Ressurreição, o Filho de Deus feito homem, leva a cabo a revelação divina. Por ele, crucificado e ressuscitado, a humanidade é envolvida pela automanifestação e autocomunicação de Deus aos homens e às mulheres.
A Ressurreição de Jesus Cristo, diferentemente da ressurreição de Lázaro, ou da filha de Jairo ou ainda do filho da viúva de Naim, faz com que a natureza humana, assumida pelo Filho eterno, entre na glória divina. Não é uma entrada que leve Jesus como homem para bem distante de nós. Pelo contrário, com a Ressurreição, Jesus de Nazaré se torna ilimitado, envolvido pelo ser de Deus. Embora se deva dizer que não há, e isso, desde a Encarnação no seio virginal de Maria, nenhuma confusão, nem mutação, nem divisão, mas afirmamos também sem separação, com a Ressurreição, essa inseparabilidade da natureza divina com a humana se torna o paradigma para falarmos de fé, de comunhão, de espiritualidade, de santidade. Quando Deus criou, quando Deus fez aliança, quando “Deus enviou seu Filho, nascido de mulher” (Gl 4,4) e quando Deus ressuscitou seu Filho das garras da morte, essa inseparabilidade se tornou ainda mais forte. E é a partir disso que, sendo testemunhas do Ressuscitado, somos chamados a ter e a viver uma “existência pascal”.
Uma existência pascal se dá pela observância do mandato de Cristo, feito na última ceia: “fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19; cf. 1Cor 11,24s). Vivendo da memória do Salvador, podemos ter uma existência pascal. Celebrar a sua memória não significa postar-se ao passado, mas reconhecer que a sua memória se torna “memorial”, isto é, realidade vivente, presentificada pelo Espírito que renova e faz eficaz o evento salvífico realizado na cruz. Essa existência pascal, vivida por nós, é expressa pela nossa comunhão no mistério eucarístico. Jesus mesmo exorta a que entendamos assim o sentido da comunhão com o Pão da Vida que é ele mesmo: “Assim como vive o Pai, que me enviou, e eu vivo pelo Pai, quem se alimenta de mim, também ele, viverá por mim” (Jo 6,57).
Uma existência pascal nos leva a ter o mesmo pensamento de Cristo, os mesmos sentimentos presentes nele, como afirma o Apóstolo dirigindo-se aos cristãos de Filipos, antes de apresentar o hino em que expressa como o mistério do Filho de Deus se revela ao mundo: “Tende em vós o mesmo pensamento de Cristo Jesus” (Fl 2,5). Assim compreendemos como uma existência pascal se projeta no mundo – através da doação de vida, de uma impostação de humildade, de “abaixar-se” em prol do outro, de testemunhar o caminho de sequela do Crucificado, e de ter esperança na glória que virá, não com contornos mundanos, mas aquela glória do Reino, destinada aos seguidores do Servo sofredor.
Por fim, uma existência pascal é experiência de participar do mistério da morte e ressurreição do Senhor, vivificada no Batismo. Ainda é o Apóstolo a nos exortar: “Pelo batismo, fomos sepultados com ele na morte, a fim de que, assim como Cristo foi ressuscitado dos mortos pela glória do Pai, também nós caminhemos em uma vida nova” (Rm 6,4); “Se ressuscitastes com o Cristo, buscai as coisas do alto, onde o Cristo está, sentado à direita de Deus” (Cl 3,1). A vida nova que a existência pascal significa se dá como um permanecer no amor de Cristo (cf. Jo 15,9-11), na vivência do mandamento do amor deixado por Ele na última ceia (cf. Jo 15,12-17).
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