Por Pe. Matias Soares Pároco da Paróquia de Santo Afonso Maria de Ligório - Conj. Mirassol - Natal
A referência ao Espírito pode ser assumida nesta reflexão tomando duas perspectivas: uma filosófica e a outra teológica. Tomando essa direção, temos presente que na base de todo e qualquer movimento da história há o protagonismo do Espírito. A titulo de síntese, penso que o pensador moderno que mais organizou essa concepção foi G. W. F. Hegel (1770-1831). Para ele “a totalidade é a síntese”. É o espírito absoluto que possibilita esse reconhecimento do todo nas partes. No comentário à obra – Fenomenologia do Espírito – Lima Vaz afirma que a fenomenologia apresenta três significações fundamentais a saber: - a filosófica – a cultural – a histórica. Tomo a questão que o comentador apresenta acerca da cultura, quando interroga que “uma significação cultural definida pela interrogação que habita e impele o ‘espírito do tempo’ na hora da significação hegeliana: O que significa, para o homem ocidental moderno, experimentar o seu destino como tarefa de decifração do enigma de uma história que se empenha na luta pelo Sentido através da aparente sem-razão dos conflitos, ou que vê florescer ‘a rosa da Razão na cruz do presente?” Sem outras pretensões, o que busco é a fundamentação para dizer que a história, por mais que se nos apareça marcadamente contraditória, é um reflexo desse Espírito absoluto, concebido intrinsicamente pela Razão. Para o filósofo alemão, a filosofia, a cultura e a história desenvolvem-se e devem ser interpretadas com e a partir da Razão.
Em âmbito teológico, podemos assumir o que ensinara o Papa São João Paulo II tratando sobre o Espírito e o seu papel inicial e continuado na vida da Igreja:
“O tempo da Igreja teve início com a ‘vinda’, isto é, com a descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos, reunidos no Cenáculo de Jerusalém juntamente com Maria, a Mãe do Senhor. O tempo da Igreja teve início no momento em que as promessas e os anúncios, que tão explicitamente se referiam ao Consolador, ao Espírito da verdade, começaram a verificar-se sobre os Apóstolos, com potência e com toda a evidência, determinando assim o nascimento da Igreja. Disto falam em muitas passagens e amplamente os Atos dos Apóstolos, dos quais nos resulta que, segundo a consciência da primitiva comunidade — da qual São Lucas refere as certezas — o Espírito Santo assumiu a orientação invisível — mas de algum modo ‘perceptível’ — daqueles que, depois da partida do Senhor Jesus, sentiam profundamente o terem ficado órfãos. Com a vinda do Espírito eles sentiram-se capazes de cumprir a missão que lhes fora confiada. Sentiram-se cheios de fortaleza. Foi isto precisamente que o Espírito Santo operou neles; e é isto que Ele continua a operar na Igreja, mediante os seus sucessores” (cf. Dominum et Vivificantem, 25).
O Movimento de Natal pode e precisa ser pensado com a consideração destes paradigmas: o filosófico e o teológico. Temos que atualizar o seu sentido, mais uma vez com a atenção aos novos sinais dos tempos. Conhecendo os grandes acontecimentos que provocaram a nossa reviravolta interna, enquanto Igreja Particular de Natal, naqueles idos, como também os que ensejaram o Concílio Vaticano II, podemos perceber que as nossas metodologias não podem ser as mesmas, porque os avanços técnicos e ideológicos são outros, mas o Espírito da e na história, está acontecendo. A razão e a fé, especialmente na nossa Tradição cristã católica, estão interligadas. A Igreja de Natal necessita de um ‘novo movimento’! Não para fomentar o clericalismo, a institucionalização das burocracias, da teologia de sacristia e desencarnada, dos idealismos sem rosto e sem nome, das formalidades sem proximidade e compaixão, do sacramentalismo com sua instrumentalização. O novo movimento que a Igreja de Natal tanto necessita, é aquele que realiza-se pela abertura e docilidade à ação do Espírito Santo. Aquele que gera discernimento, escuta, diálogo, proximidade, testemunho, pés no chão e na vida das pessoas, com atenção às periferias geográficas e existenciais, com fomento da mistagogia sacramental, com uma grande paixão pela conversão, anúncio e alegria do Evangelho, tendo em vista a cultura pós-orgânica, pós-humana e pós-moderna. A Igreja de Natal assim, como em tempos passados, precisa assumir o seu protagonismo no hoje da história. Essa que, mesmo sendo dos homens; para nós, não pode deixar de ser de salvação.
Enfim, teremos nos próximos anos a oportunidade de celebrar um Sínodo arquidiocesano. Assumamos espiritualmente essa atenção ao que somos chamados a ser enquanto discípulos missionários. Todos que somos o povo de Deus, que está contido e faz a história humana e de salvação da catolicidade, que concretiza-se entre nós e para o mundo, somos chamados a rezar e estudar para que as pulsões do Espírito nos tornem capazes de sermos testemunhas credíveis e razoáveis para a promoção dos novos movimentos que tragam mudanças pessoais e estruturais, tanto para a Igreja, quanto para a sociedade. Assim o seja!