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O Corpo do Sínodo

Pe. Matias Soares

Pároco da paróquia de Santo Afonso M. de Ligório - Natal-RN


A nossa Arquidiocese de Natal deu abertura, na pessoa do seu Pastor Próprio, Dom João Santos Cardoso, ao processo do seu Sínodo. O evento será uma oportunidade kairótica. Iluminados e conduzidos pelo protagonista primeiro, que é o Espírito Santo, teremos a oportunidade de viver um novo pentecostes na dinâmica missionária da nossa Igreja Particular. O nosso Arcebispo, em sua homilia da missa, durante a qual fizemos o juramento e a profissão de fé, enfatizou a centralidade da oração, consistência e abertura ao que somos chamados a viver para o bem de todo o povo de Deus, que compõe a nossa Igreja arquidiocesana. Por isso, será um tempo de graça e de movimento esperançoso para o nosso compromisso com a conversão ao estado permanente de missão, tanto internamente, quanto externamente, como para o nosso estilo de testemunhar a fé, a esperança e a caridade neste mundo pós-moderno, com sua cultura qualificada por alguns como pós-cristã.

 

Refletindo o evangelho do dia (cf. Mt 6, 1-6.16-18), Dom João, chamou-nos à atenção para que aprofundemos o nosso modo de nos relacionar conosco, com o outro e com Deus. É importante a consciência da nossa identidade e da nossa responsabilidade em tratar com seriedade e profundidade o que tem a ver com o que neste momento da história arquidiocesana estamos a celebrar. Fazendo menção às personalidades como Pe. Tiago, Monsenhor Expedito e tantos membros do povo de Deus que nos precederam, o metropolita lembrava a todos o que agora estamos assumindo para o dinamismo, a renovação e o enfrentamento dos desafios que o mundo de hoje nos impõe. Não existe mais lugar para uma ação evangelizadora que não esteja atenta aos sinais dos tempos. O Sínodo tem que nos levar ao discernimento, a partir da leitura da Palavra de Deus, da escuta uns dos outros, como filhos da Igreja, em comunhão eclesial, sem confusões ideológicas, mas com grande abertura aos movimentos do Espírito, e ao envolvimento com as situações reais e emergentes da nossa história, especialmente em nosso contexto potiguar, com abertura ao que é planetário.

 

Sendo assim, faz-se mister que comecemos a dar corpo ao nosso evento sinodal. É importante que as nossas narrativas sejam de promoção deste acontecimento. Em outras reflexões, já ponderei que nos falta uma ‘narrativa pastoral’. Há um vácuo propositivo em nossas assembleias eclesiais. Na situação atual, caberia uma autoanalise acerca de qual é o ‘rosto missionário e pastoral da Arquidiocese de Natal’. Há anos que não temos uma construção transversal em nossas reuniões pastorais. A V Conferência de Aparecida, com sua chamada à conversão pastoral, a partir do encontro pessoal com Jesus Cristo, não foi levada a sério como deveria. A “Alegria do Evangelho” – Papa Francisco – precisa ser a nossa cartilha permanente em nossos assessoramentos e articulações. Mas, como não houve consistência e empenho firme no que a Igreja propôs para todos nós, enveredamos pela repetição da sacramentalização, curandeirismos, invencionices devocionais e movimentos retrópicos que nos levam dia-após-dia às sacristias, com a conservação do mais do mesmo, sem ousadia e com apatia aos grandes desafios para a evangelização no contemporâneo.

 

A partir destas reflexões introdutórias, venho com sentimento de pertença e amor à nossa Igreja Local, já propor, num primeiro momento, três ações que poderão entrar no desenvolvimento – corpo – do nosso acontecimento sinodal, a saber:

 

1)        – Uma semana de espiritualidade para todas as comissões que terão a missão de dinamizar o Sínodo: a vitalidade dos acontecimentos sinodais terá na oração a sua energia. Jesus Cristo nos ensina a colocar a confiança nas opções que somos evocados a fazer na intimidade com o Pai. Poderia fazer várias menções às práticas orantes de Jesus, além da oração do Pai Nosso; mas, os remeto unicamente à sua oração sacerdotal (cf. Jo 17). Como é gratificante ver e sentir a oração Dele ao Pai, por nós e pelo fato de estarmos no mundo, sem sermos dele. O Padre José Comblin tem uma obra singela e muito significativa sobre a “oração de Jesus”. Quando falamos e tratamos deste tema, sem dúvida, o nosso maior Mestre no assunto é o próprio Senhor. Se quisermos dar a verdadeira e testemunhal importância ao significado da oração para a vivência eclesial do Sínodo, os primeiros a dar o exemplo somos nós, que assumimos pessoalmente e publicamente o empenho na organização do evento. E depois, envolver todas as comunidades nesse clima de espiritualidade e docilidade à ação do Espírito Santo.

  

2)        – Uma semana de aprofundamento teológico pastoral aberto a todos os discípulos missionários da nossa Arquidiocese: há anos que não temos um aprofundamento teológico pastoral consistente em nossa Arquidiocese. Até os cursos dos presbíteros está encolhido. Saímos de quatro ou cinco dias e agora estamos em dois e meio. Com a participação, nem sempre integral de alguns. Santa Teresa de Ávila nos lembra da necessidade da oração e do estudo (cf. Castelo Interior), como meios imprescindíveis para o fortalecimento da nossa vida interior. A metáfora usada pela doutora e grande reformadora da Igreja é providencial para pensarmos que, assim como a nossa harmonização interior, a nossa condição eclesial também necessita destas práticas de amor para o robustecimento da ação pastoral da nossa Igreja arquidiocesana. A Igreja é o corpo místico de Cristo e necessita destes valores irrenunciáveis para afugentar as doenças que afligem a sua sanidade.

 

3)        – Um Congresso Eucarístico: a terceira proposição, e não menos importante, é a realização de um Congresso Eucarístico arquidiocesano. A Igreja vive da Eucaristia. O aprofundamento da teologia eucarística confirma justamente o sentido da sinodalidade. Na Eucaristia, temos a síntese particular e universal do que é a identidade do Sínodo. Ainda mais, nas circunstâncias em que nos encontramos, onde a Eucaristia tem sido “coisificada” e manipulada, em algumas situações com relativismos e usurpações cavilosas, ou pensamos a Eucaristia a partir do mistério pascal de Jesus Cristo para nossa salvação, ou estaremos pouco a pouco tirando do povo fiel de Deus o direito de viver autenticamente o que ela – a eucaristia – é por si mesma. “A eucaristia é o mistério da fé e sacramento do amor para a salvação do mundo”. Um Congresso Eucarístico, vivido com objetivos ligados ao que é o anseio do Sínodo, será um acontecimento catalisador para a implementação das construções teológicas, disciplinares, administrativas e pastorais do que teremos o ônus de concretizar, tendo em vista o que a nossa Igreja arquidiocesana deve ser no presente e no futuro, com memórias do seu passado.

 

Enfim, o desenrolar do Sínodo tem muitas possibilidades que deverão nos inquietar, ocupar e fazer com que caminhemos em participação, comunhão e missão. A nossa postura deve ser um reflexo das relações da Trindade. A Igreja ou é sinodal, ou não tem identidade. São João Crisóstomo identificava a Igreja somo sinônimo de sínodo. Num mundo marcado por divisões e polarizações ideológicas, o Sínodo será para a nossa Igreja um ‘respiro da alma’. Temos uma oportunidade ímpar. Façamos um percurso com empenho, alegria, esperança e ousadia. Que Nossa Senhora da Apresentação interceda pelo bom êxito e profícua vivência deste Sínodo. Assim o seja!


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