Pe. Matias Soares
Pároco da paróquia de Santo Afonso Maria de Ligório
Natal-RN O Papa Francisco tem insistido para que façamos memória da nossa história. Os referenciais teóricos desta perspectiva consideram o caminho espaço temporal para que reconheçamos e manifestemos a nossa identidade. É momento de nos questionarmos acerca do que pensam as pessoas, tanto interna como externamente, sobre o que é a Igreja. Quais caminhos são seguidos pelos discípulos de Jesus Cristo na constituição da realidade da Igreja? A V Conferência de Aparecida, que neste ano celebra os seus quinze anos, nos interpela à uma ‘conversão pastoral, a partir do encontro pessoal com Jesus Cristo, nesta nova realidade cultural, marcada por uma profunda ‘mudança de época e época de mudança (cf. Ap. II cap).
A Igreja Particular de Natal tem uma história grandiosa de testemunho evangélico e organização pastoral. Desde os primórdios da minha formação seminarística, ouvi tanto sobre as ações eclesiais, evangélicas e sociais da nossa (Arqui)Diocese. Aqui ressalto, mais especificamente, o ‘Movimento de Natal’. Por onde passei, sempre foi motivo de orgulho lembrar e testemunhar os feitos da nossa Igreja Particular. Quando não era pensado a partir de perspectivas ideológicas, falar sobre Dom Eugênio Sales era formidável. Um homem de envergadura ímpar. Quanta respeitabilidade! Mesmo os que não concordavam com seu estilo pastoral, não colocavam em dúvida a sua ‘autoridade eclesial e ética’. Com ele, vêm tantos vultos sacerdotais do nosso Presbitério. Cada fiel desta Igreja pode lembrar dos tantos 'ministros ordenados' que marcaram positivamente a sua história pessoal, eclesial e social.
Passando pelos corredores da nossa Cúria arquidiocesana, como era bom contemplar aquele folder com as fotografias e a seguinte afirmativa: “no início, erámos seis”. Eita, que provocação?! Com eles, caminhando ‘sinodalmente’, estavam tantos religiosos(as) e milhares de fiéis leigos, que acreditavam no projeto; que eram ‘encantados’ com as tantas possibilidades e iniciativas que eram realizadas, tendo em vista o bem comum na Igreja e na sociedade como um todo. Depois desta fase, que foi de crescimento não só evangelizador e pastoral, mas também administrativo, a Arquidiocese tinha e adquiriu um patrimônio, que era sempre usado tendo-se em vista a missão da Igreja e o desenvolvimento integral e integrante do Povo de Deus. Não era 'pastoral nem administração de conservação'. Depois destes sinais, sem dúvida, muitas outras iniciativas estruturais e pessoais foram concretizadas. Construções de igrejas, a canonização dos Protomártires do Brasil. Cabe aqui um testemunho pessoal: que, tanto na beatificação, quanto na canonização, eu estava em Roma e participei como seminarista e depois como sacerdote, nos dois momentos. Foi marcante aquele momento! A Igreja de Natal vista e confirmada como terra de mártires, que sempre foram para Igreja, “semente de novos cristãos” (Tertuliano). Depois deste evento, a nossa história deveria ganhar um ‘rosto renovado’. Tivemos a V Conferência Latino- americana, a convicção posta foi a de que “todos nós, somos chamados a ser ‘discípulos missionários’. Veio o Papa Francisco, as orientações foram universalizadas pelas suas palavras (Alegria do Evangelho) e sua vida, pois ele é ‘FRANCISCO’.
A questão é que somos evocados a olhar a nossa situação interna e, com olhar realista e honesto, sem ingenuidades e autoenganos, como somos vistos pela sociedade e pelo mundo, já que estamos na Era das novas tecnologias e mídias digitais. Não esqueçamos que o próprio Jesus questionou os seus discípulos sobre o que estavam dizendo sobre Ele (cf. Mt 16, 13-19). Essa preocupação precisa existir da nossa parte, caso nos preocupemos com o bem da Igreja!? Se de fato a amamos, se de coração a reconhecemos como mãe e mestra, se temos uma consciência que não é corrompida, se não estamos com a nossa alma ‘desfigurada’ pelo pecado, então nos colocaremos em situação de oração e vigilância (cf. Mt 26,41). É a nossa identidade e credibilidade evangélicas e eclesiais que sempre estarão em jogo. Como não considerar essas questões?!
Os grandes teólogos modernos, principalmente aqueles que foram peritos no Concílio Vaticano II e os que trabalharam teologicamente na sua recepção, tiveram como uma das suas preocupações transversais o tema da ‘credibilidade da Igreja’. Leiamos esses gigantes! Esse será um dos temas fundantes da teologia pós-conciliar e fundamental. E pensemos e nos questionemos, com eles, em que consiste a nossa credibilidade? E a resposta será: ‘no Testemunho’. Não cabe à nossa superficial teologia estar com narrativas auto justificadoras. Essa construção tem sido detectada nas falas dos grandes demagogos da pós-modernidade, principalmente no âmbito político. Os nossos caminhos precisam ser, com urgência, bem outros, tantos nas palavras, como nas ações. E qual o nosso conteúdo? O Evangelho; seu anúncio e a nossa conversão a Ele. Só o tendo como projeto de vida, poderemos superar o ‘mundanismo espiritual’, que adoece e enfraquece o ‘Corpo Místico de Jesus Cristo’.
Por fim, é tempo de esperança! A Igreja é de Deus. Ela é Sacramento de Jesus Cristo no mundo e no coração da história. As ‘noites escuras’ que assolam alguns momentos do seu itinerário, jamais apagaram o Sol que a ilumina. Os erros dos movimentos históricos são fumaça que intoxicam, mas não matam. É o Espirito Santo que a vivifica. O seu rosto materno é fulgurante. Todos nós passaremos e a Igreja permanecerá, até o fim dos tempos (cf. Mt 16,18). Sejamos homens e mulheres amantes da oração e do estudo! Avancemos e confiemos na graça de Deus. Observemos, leiamos e façamos o ‘discernimento’ dos sinais dos tempos. As memórias feitas da nossa história nos animam profundamente. Vivemos outros tempos, mas as bases que nos sustentam na missão são as mesmas. As busquemos, as cultivemos e as testemunhemos. Viva a Igreja de Natal! Assim o seja!