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ARTIGO - A espiritualidade da presença


Por Pe. José Marcos Silva de Lima

Diretor espiritual do Seminário de São Pedro


A virtualidade do mundo pós-moderno demonstra a cada dia que o encontro humano está cada vez mais escasso. As pessoas com frequência passam muitas horas por dia nas telas do celular ou dos computadores. Interagem com a máquina, mas a máquina não é um ser humano que pode interagir com afetuosidade de alma. A virtualidade muitas vezes torna o coração  vazio e incapaz de estabelecer verdadeiras relações interpessoais fisicamente falando.

 

No campo da espiritualidade se fala muito no encontrar-se com os outros. Porém, os encontros humanos são cada vez mais desprovidos de alteridade e troca de sentimentos de afeto e ternura. Nos shoppings centers, verdadeiras catedrais do indiferentismo é comum vermos pessoas sentadas num mesmo ambiente, cada uma no seu mundo virtual, ou seja, o conversar ao celular é muito mais importante do que o conversar com o amigo ou amiga que está na sua frente. A presença do outro é simplesmente ignorada.

 

A espiritualidade requer presença. Não qualquer presença, senão, aquela que é capaz de marcar o outro com o rastro da permanência, mesmo quando chega o momento da partida. Existem pessoas cuja presença é ausência e outras, cuja ausência física se torna presença na memória do coração. Um pai não é pai apenas porque provê o alimento para os filhos, e sim, porque sua presença se torna para eles uma bela morada do amor.

 

Ao escrever essas simples palavras lembro-me do saudoso Monsenhor Luiz Lucena Dias, que por muito tempo foi pároco da cidade de João Câmara. Sacerdote santo e com um trabalho pastoral e social de relevo na região. Ele, já idoso e com saúde frágil, participava da reunião do clero em Natal. Saía de sua cidade interiorana até a capital para participar desta reunião. Certo dia eu lhe perguntei o porquê dele, mesmo idoso e com problemas de saúde, ainda assim, participava ativamente das reuniões mensais do clero. Ele simplesmente me respondeu que a presença é muito maior do  um se encontrar num determinado ambiente. Muito mais do que estar presente é preciso ser presença.

 

A espiritualidade da presença é algo que transcende o aspecto físico e geográfico. Ela torna a presença uma luz que brilha nos corações obscurecidos pelo vazio de afeto que se encontra em tantas pessoas. A espiritualidade da presença é capaz de dissipar o medo, a angústia e o desespero de corações embaçados pela falta de um olhar envolvido pelo sentido.

 

Por mais que a virtualidade das novas ferramentas de comunicações seja um grande bem para a nossa vida tão dinâmica, não pode jamais substituir o encontro humano permeado pela troca do olhar que reflete nossa capacidade de ver o outro como meu irmão e amigo

e não como meu inimigo. A espiritualidade da presença une não corpos que transmitem insatisfações existenciais, mas, corações que se amam e fazem da alegria da vida um cântico de amor que das profundezas da alma grita por completude, reciprocidade de dons, amizade, paz. A espiritualidade da presença nada mais é do que a presença de Deus no mais profundo de nossa existência. Uma existência redimida no Cristo que é a presença mais presentificada daquele que por amor, num profundo ato kenótico se tornou presença eterna em nossa vida.

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